Regressámos às entrevistas da série de “5 Perguntas” a reviewers de jogos de tabuleiro, desta vez com Micael Sousa, responsável pelo canal Jogos no Tabuleiro.
Como é que começou o teu interesse por jogos de tabuleiro? Sempre joguei desde a infância, aqueles jogos clássicos do mercado de massas. Depois dediquei-me muito mais aos jogos digitais, no entanto, com cerca de 14 anos, comecei a jogar Magic: The Gathering (MTG), algo que continuei a fazer intensamente, mas com algumas interrupções, nos 12 anos seguintes. Foi nesse ambiente que conheci os jogos de tabuleiro modernos, o Catan há cerca de 20 anos. Gradualmente, fui desligando do MTG e dos jogos digitais, até que passei a jogar mais no círculo restrito de amigos e com a esposa, principalmente jogos de tabuleiro modernos de forte pendor estratégico. Em 2009 fui à primeira Leiriacon e o mundo mudou para mim. O que é que valorizas mais num jogo enquanto jogador? Valorizo muitas coisas. Tenho uma extensa ludoteca neste momento, por várias razões. Do ponto de vista do jogador tento ter jogos para vários contextos. Jogos para jogar em ambientes específicos e com determinados jogadores. Tenho jogos para jogar com a família, com as crianças, com a esposa e com alguns amigos que andam nestas andanças há muitos anos também. Depois tenho também jogos que preciso para o meu trabalho, de investigação, de desenvolvimento de novos jogos e de formações e aulas que vou conduzindo no âmbito dos serious games. Mas tendo de me definir, eu diria que gosto de sistemas sólidos de mecânicas, que me proporcionem uma dimensão estratégica e liberdade para a implementar, tendo significado temático sempre que possível. Isto faz com que goste de muitos jogos económicos e de planeamento, mas também de alguns "caixa de areia" (sand box) mais interativos. Gosto de jogos que contem uma história depois de os jogar, sem que a história nos seja imposta e resulte de textos pré-definidos. Também gosto de jogos com boa presença de mesa, os componentes têm sempre a sua importância na experiência, apesar das pessoas serem o elemento mais importante para tudo funcionar. Como é o teu processo de análise e posterior divulgação? Tenho duas linhas de pesquisa de jogos novos: os jogos para jogar e os jogos para usar em contexto de aplicação séria, relacionada com o meu trabalho. Isto obriga-me a abrangência, ao ponto de ter de jogar e estudar, por exemplo, jogos colaborativos que pouco me atraem como jogador, embora lhes reconheça os méritos. Por isso vou pesquisando principalmente no Boardgamegeek mas seguindo também outros produtores e divulgadores de conteúdos que estão sempre em cima do acontecimentos. Depois escolho, com base nessas informações, aqueles que vou jogando e testando. Tento fazer analises segundo uma metodologia mais ou menos informal, mas que resulta das pesquisas que faço na literatura da especialidade. No fundo acabo por divulgar jogos que gosto ou que sinto terem algo de inovador que os faça destacar entre a imensidão de coisas novas que vão saindo. Se te pedem para analisar um jogo de que não gostas, é-te difícil fazer uma crítica negativa sobre ele? Já recusei vários pedidos de análise de jogos, porque sei que não eram o tipo de jogos que eu iria apreciar ou de onde poderia retirar algo que pudesse destacar como positivo tendo em conta a política de conteúdos do meu canal. Penso que temos de ser honestos e se estivermos a fingir isso nota-se depois no vídeo. Tento no canal abordar jogos de maior complexidade, pois são aqueles que tendo a apreciar mais. Faço pontualmente algumas coisas diferentes para tentar abrir mais os conteúdos, no entanto isso tem objetivos intencionais que vão muito para além da mera apresentação de um jogo específico. Assim evito fazer críticas negativas, também porque acho ser absurdo quando criticamos negativamente um jogo só porque não coincide com a nossa preferência. Os perfis de jogadores são imensos, o que não significa que um jogo que não gostamos seja mau jogo. O problema é que tenho pouco tempo para jogar jogos que não gosto. No entanto tento fazer críticas construtivas mesmo dos jogos que aprecio e vou mostrando, tendo acontecido fazer isso em jogos de autores com quem lido regularmente. O meu canal não tem como principal objetivo ser um veículo de divulgação das editoras, embora o possa fazer indiretamente. Acaba por fazer isso em parte, mas apenas quando eu tenho interesse particular no jogo em causa. Não tenho atualmente intenção de transformar o canal num prestador de serviços, num trabalho formal. Pretendo ter prazer ao fazer os vídeos, por isso falo dos jogos que aprecio, mas também do que está para além dos jogos, uma vez que é algo que me tem igualmente apaixonado, esta coisa do meta-jogo e da filosofia dos jogos. Do ponto de vista mais sério vou fazendo outro tipo de conteúdos que se relacionam com o meu trabalho, aí já tem uma maior relação com um serviço que tento proporcionar, mesmo que ninguém o queira consumir pois funciona mais como forma de auto treino e de evolução pessoal. Quais são os maiores desafios que enfrentas na criação de conteúdos? Os desafios são imensos, principalmente a falta de tempo, conhecimento e recursos. O tempo é sempre pouco, tanto para jogar todos os jogos que me interessam como para os jogar na quantidade de vezes que se exige para os poder abordar com algum rigor. Fazer os vídeos e editar o material final dá imenso trabalho, são muitas horas gastas. Do ponto de vista dos recursos faltam sempre coisas. Primeiro falta conhecimento, que para mim acaba por ser também um recurso, pois é preciso ter conhecimento técnico para planear a produção, ter os conteúdos sólidos, editar os vídeos e saber difundir de modo adequando. Tirando a parte da literatura de jogos, eu não tenho formação específica profunda para nada disto, o que me obriga a constante estudo e aprendizagem, a testar e a errar para aprender. Por outro lado, ao fazer as contas dos custos monetários, todos os equipamentos necessários são muito caros. Câmaras, tripés e sistemas de fixação, microfones, iluminação, computadores, armazenamento, software e afins. Somando tudo, as dificuldades são muitas, mas como isto é um hobby e se faz por paixão pelos jogos e a comunidade, ficando um sentimento global de progressão ao fazer, eu diria que o resultado pessoal é positivo e para continuar. As interações com quem nos segue e acompanha conta muito para acumular energia para continuar a fazer conteúdos.
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